Em poucos dias, jornalista perdeu todos os familiares para a Covid-19
"Não existe lição, compreensão ou justificativa para um sofrimento tão grande", desabafou
Fabiano Maisonnave, de SÃO PAULO – “Este lar era feito de quatro colunas que sustentavam um teto. Em uma semana, três colunas foram arrancadas sem nenhum aviso prévio. Eu me pergunto: como uma única coluna vai sustentar este teto?”
Primeiro, a jornalista campo-grandense Súzan Benites perdeu a mãe, Roseneide Nara. Em seguida, morreu o único irmão, Rafael Benites. Na madrugada deste sábado (20), ela despediu-se do pai, Atanacildo Nara.
Em um intervalo de oito dias, Benites, de 31 anos, viu toda a família desaparecer, vítima da Covid-19. O seu namorado, Bruno Nascimento, recebeu alta neste domingo (21) após 11 dias internado com a doença.
“Não existe lição, compreensão ou justificativa para um sofrimento tão grande. Há 15 dias, eu tinha um lar de muito amor, parceria, cumplicidade, planos, projetos, e hoje eu tenho nada. A única certeza que eu tenho é que fomos muito felizes juntos e seremos nós quatro para toda a eternidade”, escreveu, em sua página no Facebook.
“Não resta nada de mim, porque eu não existo sem vocês. Espero mesmo encontrá-los em breve. A dor é sufocante, mas meu amor ainda é muito maior”, escreveu.
Semanas antes, Benites já havia perdido um amigo e colega do jornal Correio do Estado, onde é subeditora. O repórter fotográfico Valdenir Rezende, 55, morreu em 28 de fevereiro. Deixou dois filhos, que seguem a profissão do pai -um deles trabalha no mesmo veículo.
A morte de Rezende e o drama de Benites em meio ao pior momento da pandemia em Mato Grosso do Sul vêm comovendo os jornalistas, que sofrem com hostilidades e insultos durante a cobertura da epidemia.
Na quinta-feira (18), a repórter da TV Morena (afiliada da Rede Globo) Luana Rodrigues gravava diante do Hospital Regional, em Campo Brande, quando uma mulher se aproximou da equipe, fez o sinal da cruz e disse: “Deus me livre desse povo que só fala de Covid”.
“A gente fala e vai continuar falando”, disse Rodrigues, na reportagem. “O hospital está lotado. São 120 vagas para pacientes com Covid-19 e já estão todas ocupadas. Eles tiveram de improvisar leitos. O hospital não tem profissionais em número suficiente para atender os pacientes porque parte deles está afastada por causa da Covid. Temos mais de 3.700 mortes aqui no estado, quase 200 mil casos e 31 mortes só hoje.”
Em seguida, do estúdio, a apresentadora Bruna Mendes, com a voz embargada e em lágrimas, perguntou sobre a falta de leitos do hospital ao secretário de Saúde de Mato Grosso do Sul, Geraldo Resende.
“É uma corrida frenética, e infelizmente a gente tem de suportar esse tipo de agressão”, respondeu Resende.
“Acredito que haja pessoas com apagão cerebral. Quem faz agressão à equipe de TV, qualquer que seja a emissora, é realmente porque acabou a empatia.”