Robinho é condenado definitivamente por estupro coletivo na Itália
Além de nove anos de prisão, jogador terá de pagar que equivale a R$ 374 mil
O atacante Robinho, 37, foi condenado nesta quarta-feira (19), na terceira e última instância da Justiça italiana, pelo crime de estupro coletivo, cometido há nove anos em Milão, quando ele jogava pelo Milan. Com a sentença, que é definitiva, ele passa a ser considerado culpado e deve cumprir a pena de nove anos de prisão, além da multa de 60 mil euros (R$ 374 mil).
A condenação e a pena também foram confirmadas para o amigo do jogador Ricardo Falco. Assim como nas outras vezes, nenhum dos dois réus esteve presente no julgamento, ocorrido na 3ª Seção Penal do Supremo Tribunal de Cassação, em Roma.
Nas duas instâncias anteriores, eles negaram o crime. Os advogados de Robinho sustentavam que não havia provas de que a relação com a vítima -uma mulher albanesa que hoje tem 31 anos e vive na Itália- não tenha sido consensual.
Na audiência desta quarta, que começou por volta das 10h30 (6h30 de Brasília) e durou cerca de 30 minutos, os recursos dos advogados de defesa foram recusados pelo colégio de cinco juízes, presidido por Luca Ramacci.
A defesa tentou reverter a condenação na segunda instância, pelo Tribunal de Apelação de Milão, em dezembro de 2020. Nessa fase final do processo, a Corte de Cassação analisou aspectos exclusivamente técnicos, sem entrar no mérito da questão.
Os advogados de Robinho contestaram o fato de que parte do material apresentado no recurso da segunda instância não tenha sido aceito como prova, como o dossiê com cerca de 40 imagens da vítima, retiradas de suas próprias redes sociais, em que ela aparece ingerindo bebidas alcoólicas. As fotos, com a intenção de desqualificar a vítima, foram consideradas irrelevantes pelo Tribunal de Milão.
No veredicto, a Corte de Cassação declarou, então, que o recurso era inadmissível e confirmou integralmente a decisão da corte milanesa. As motivações da decisão serão divulgadas em 30 dias.
“Acreditamos que a decisão de hoje é certa, assim como foram corretas as decisões de primeiro e segundo grau, inclusive em relação à pena e à multa. Para nós, está tudo certo. Esperamos que a execução aconteça. Sabemos que o problema é que os culpados estão no Brasil, e pode haver questões de natureza constitucional para um eventual pedido de execução da pena”, disse à reportagem o advogado que representa a vítima, Jacopo Gnocchi.
“Acredito que o Brasil é um grande país, não pode proteger culpados, tem que proteger as vítimas. Esse foi um processo que concedeu, do começo ao fim, todos os direitos de defesa para quem foi julgado culpado. Foram 15 juízes, desde a investigação até hoje, que consideraram culpados esses dois”, afirmou.
“Pessoalmente, vejo isso como um problema de foro diplomático, político, executivo -chamem como quiser. A sentença definitiva agora existe. A bola agora passa para o Brasil.”
A vítima, que estava presente na audiência de julgamento, não quis comentar. “Ela prefere não dar declarações. Mas podemos dizer que não é um sentimento de vingança, é simplesmente o reconhecimento de que foi feita Justiça, pelo menos no papel.”
Seu advogado afirmou que a decisão mostra que as mulheres vítimas de violência precisam denunciar os crimes.
“As autoridades existem, o sistema existe. Sei que é demorado. Mas é preciso denunciar, denunciar e denunciar. A tutela, infelizmente ainda, passa pelo sistema judiciário. No dia em que mudar a cabeça, a mentalidade das pessoas, talvez tenhamos menos violência de gênero. Mas hoje tem que passar pelos canais judiciários.”
Antes de iniciada a sessão, Alexander Gutierres, um dos advogados de defesa de Robinho na Itália, comentou com jornalistas que o processo continha falhas, que o jogador era inocente e que ele foi “massacrado pela mídia”.
Procurado posteriormente pela Folha, ele respondeu que não comentaria o desfecho.
Segundo o advogado da vítima, se os réus fossem italianos, seria emitida imediatamente uma ordem de execução da pena. “Ou eles se apresentariam voluntariamente na prisão ou iriam buscá-los. Hoje ou amanhã, algo rápido”, disse, falando em teoria.
A Constituição brasileira impede a extradição de seus cidadãos para países onde os crimes tenham sido cometidos.
No entanto, a legislação brasileira prevê na Lei de Migração (13.445/17), artigos 100 a 102, a transferência de execução de pena para os casos em que a extradição não é possível devido à nacionalidade. Em tese, as autoridades italianas precisam solicitar ao Superior Tribunal de Justiça brasileiro o cumprimento da pena no país.
Segundo Gnocchi, a execução é uma tarefa realizada autonomamente, sem o envolvimento dele. O Tribunal de Apelação, onde se encontra a sentença definitiva do caso, deve acionar a Procuradoria para a execução da sentença.
Gnocchi, no entanto, declarou que vai se concentrar nos outros quatro participantes do crime de estupro coletivo.
“Tem os outros quatro sujeitos que continuam como réus. Podem ser culpados ou inocentes, não sabemos. É preciso retomar esse procedimento.”
O crime
O caso ocorreu na madrugada do dia 22 de janeiro de 2013, em uma casa noturna de Milão.
Segundo investigação do Ministério Público, Robinho, Falco e outros quatro brasileiros praticaram violência sexual de grupo contra a vítima, que foi embrigada por eles e, inconsciente, levada para o camarim do estabelecimento, onde foi estuprada várias vezes. Por terem deixado a Itália durante a investigação, os outros quatro homens não puderam ser notificados, e o caso deles foi desmembrado do processo.
A acusação foi baseada no depoimento da vítima e em conversas telefônicas interceptadas com autorização da Justiça italiana, incluídas como provas no processo. Em novembro de 2017, Robinho e Falco foram condenados na primeira instância, em Milão, por estupro coletivo, segundo os artigos 609 bis e 609 octies do código penal italiano, que determina prisão de 8 a 14 anos. À época, Robinho jogava no Atlético-MG.
Os advogados de defesa recorreram, e um novo julgamento foi realizado em dezembro de 2020, quando a sentença foi confirmada pela segunda instância.
Pouco antes, em outubro de 2020, o Globoesporte.com revelou o conteúdo das escutas telefônicas. Nelas, Robinho e amigos deixam evidente que sabiam que a vítima estava inconsciente. Em uma das falas mais explícitas, o atacante diz: “Estou rindo porque não estou nem aí, a mulher estava completamente bêbada, não sabe nem o que aconteceu”.
A divulgação causou a suspensão de um acordo entre Robinho e o Santos, que o havia anunciado como parte do clube até fevereiro de 2021. O atacante está, desde então, afastado do futebol.