Fieg e Senai: a linha e a máquina que costuram a potência da indústria da moda em Goiás
Diante da dificuldade em encontrar mão de obra, indústrias facilitam ingresso no mercado de trabalho e buscam amparo em aliado histórico
São 100 agulhadas por segundo. Esse é o movimento de uma das máquinas de costura em um dos 60 cursos de moda ministrados pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) de Goiás. Nesse ritmo, há 70 anos, a entidade é um dos agentes protagonistas na modelagem da economia do estado, imprimindo uma digital goiana forte e que ultrapassa fronteiras. Alheio à crise econômica, o setor registra crescimento de 6% ano a ano.
Os dados não só impressionam como vislumbram uma espécie de roda de tear contínua que, aos poucos, pretende colocar o estado em lugares mais altos. As projeções de investimentos da Federação da Indústria do Estado de Goiás (Fieg) são para que Goiás esteja no topo da indústria da moda nos próximos anos.
Mas a história por trás dos números só pode se tornar realidade com o envolvimento de pessoas. E nisso, o Senai também não fica para trás e consegue unir gerações, ser responsável pela porta de entrada de primeiros empregos, pontapé de histórias de sucesso e transformar alunos em professores.
Uma delas é Dayane Freitas, 33 anos, que retorna à ‘casa’ pela segunda vez. Em 2007, frequentou as aulas de corte e costura, e conseguiu na indústria têxtil a primeira oportunidade de trabalho. “Aprendi [a costurar] com a minha mãe, fazendo os modelos às cegas. Mas foi o Senai que me ensinou que existe técnica e ferramentas para produzir e para tornar uma roupa mais bonita e confortável”, conta.
Naquele mesmo ano, a professora Crismarina Estevão também enfrentava um novo desafio: foi convidada a lecionar no setor de vestuário do Senai e teve a Day – como é conhecida – como uma das primeiras alunas. “A Day era muito atenta e perfeccionista. Nós sempre observamos o perfil dos alunos, pois, como eu, eles podem se tornar professores ou indicações para empresas que os buscam”, relembra.
15 anos depois a vida delas voltam a se cruzar. Ambas, cada uma à sua época, dividem a experiência de terem aprendido a modelar com uma figura histórica do Senai – Angela Maria da Silva, que já contribuiu para a formação de mais de 2 mil modelistas na entidade.
A ‘personagem’ que une as duas profissionais está mesmo longe de ser figurinista. Angela é uma das mais procuradas entre os 60 cursos de moda oferecidos pelo Senai. A maior parte deles é ministrada no bloco de vestuário da Faculdade Senai Ítalo Bologna, unidade referência no ramo.
E assim, nos últimos quatro anos, a seção de moda do Senai formou quase 9 mil pessoas. De janeiro a setembro deste ano, já são mais de 900 concluintes. A expectativa é que este número cresça em 2023, já que novos cursos estão sendo desenvolvidos pela administração. “Sempre fazemos pesquisas de interesse para entender quais são as demandas. Quando há necessidade de formação de profissionais em qualquer lugar de Goiás, é o Senai Ítalo Bologna que eles procuram”, garante a coordenadora técnica Hélia Maria de Faria.
Setor em crescimento
O aumento das vagas no Senai acompanha a necessidade de suprir uma demanda reprimida de trabalhadores no setor produtivo, que está em processo de expansão. Dados mais recentes da Federação das Indústrias do Estado de Goiás (Fieg), relativos a 2020, apontam que Goiás possui 3.183 indústrias no segmento têxtil, vestuário, acessórios, preparação do couro, calçados e cosméticos. Juntas, elas geram pelo menos 25 mil empregos diretos.
A expectativa do presidente da Câmara Setorial da Moda (Casmoda) da Fieg, José Divino Arruda, é que o contingente dobre até o ano que vem. “O setor cresceu muito nos últimos 15 anos, mas tivemos de enfrentar a pandemia e agora estamos em um momento de retomada. Estimo que teremos 7 mil indústrias e 150 mil empregos, entre diretos e indiretos”, projeta.
Na ampliação, o principal gargalo está na busca por mão de obra. “Oferecemos muitas oportunidades de primeiro emprego e, mesmo assim, sentimos falta de trabalhadores. É justamente por isso que, mais do que nunca, temos o Senai como nosso principal parceiro, fazendo parcerias e levando esses trabalhadores a um outro nível”, destaca.
Uma contrapartida que o setor tem oferecido para lidar com a dificuldade de encontrar funcionários é facilitar a contratação de jovens sem experiências. “As indústrias são ativas. Elas mesmas fecham turmas no Senai e propiciam a formação destas pessoas. Então é um lugar onde aquela pessoa pode começar com pouco ou nenhum conhecimento e ir evoluindo”, explica.
Segundo o presidente, a entidade também tem ajudado as indústrias locais a produzir moda com identidade regional. “Queremos ser o melhor do país. Temos o segundo maior distribuidor de roupas do Brasil e queremos atingir esse patamar também na fabricação. O Senai contribui para que tenhamos um produto único, com cara e qualidade de que foi produzido em solo goiano”, analisa.
Modernização
É de olho no potencial do setor, que em meio à crise econômica cresce a uma média de 6% ao ano, que entidades empresariais estão unindo esforços com o poder público para levar a moda ao interior do estado e modernizar o ramo.
Em fase de implantação, o programa ‘Cinturão da Moda’ tenta expandir os polos têxteis. A iniciativa do Governo Estadual já chegou a 11 municípios e produziu mais de 17 mil peças de janeiro a setembro deste ano. “Temos mais 19 cidades onde o projeto está sendo implantado e a meta é criar 100 mil empregos nos próximos dois anos em todo o estado”, detalha o secretário da Indústria, Comércio e Serviço de Goiás, Joel de Sant’Anna Braga Filho.
Toda profissionalização realizada no âmbito do Cinturão da Moda é conduzida pelo Senai. Para isso, a Fieg tem investido na estrutura do bloco do vestuário da Faculdade Senai Ítalo Bologna – o prédio foi inteiramente reformado no ano passado e ganhou equipamentos de última geração. Para os próximos cinco anos, a Federação estima investir cerca de R$ 30 milhões no segmento, em parceria com empresários, o Governo e o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae). A aplicação ocorre, sobretudo, para auxiliar a indústria a alcançar o modelo 4.0, que prevê a integração de diferentes tecnologias.
O processo termina, segundo a Fieg, em profissionais como a Day, que não abrem mão de estar por dentro das novidades. Com a conclusão do curso de modelagem prevista para novembro, ela já planeja a próxima formação que fará pelo Senai. “Quero me inscrever em modelagem CAD, que é no computador. Tivemos uma aula para saber como funciona e já fiquei bastante interessada”, revela.