Relator de ação que pode tornar Bolsonaro inelegível é cotado há 20 anos ao STF

Atuação como corregedor-geral eleitoral reforçou as apostas de que ele possa enfim ser indicado pelo presidente Lula (PT) à vaga no Supremo

Folhapress Folhapress -
Ministro Benedito Gonçalves. (Foto: Alejandro Zambrana/Secom/TSE)

JOSÉ MARQUES

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Presença frequente desde 2003 nas listas de favoritos ao STF (Supremo Tribunal Federal), o ministro Benedito Gonçalves ganhou protagonismo inédito ao se tornar relator no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) da ação que pode levar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) à inelegibilidade.

A atuação de Benedito como corregedor-geral eleitoral reforçou as apostas de que ele possa enfim ser indicado pelo presidente Lula (PT) à vaga no Supremo que será aberta até outubro com a aposentadoria de Rosa Weber. Além do TSE, o ministro é integrante do STJ (Superior Tribunal de Justiça).

Aos 69 anos, essa talvez seja provavelmente a última chance de Benedito de ir para o STF, já que o limite de idade para ingressar na corte é de 70 anos, que ele completa em janeiro.

No entanto, a idade também é o seu maior obstáculo para ser indicado por Lula, já que aliados têm aconselhado o presidente a escolher pessoas mais novas, que poderiam integrar a corte por um tempo maior. Ministros do STF são aposentados compulsoriamente aos 75 anos.

O primeiro indicado ao Supremo no terceiro mandato de Lula, Cristiano Zanin, por exemplo, tem 47 anos.

A ação que será julgada a partir de quinta-feira (22) no TSE, com relatoria de Benedito, foi apresentada pelo PDT e tem como foco a reunião com embaixadores protagonizada por Bolsonaro em julho do ano passado, na qual ele repetiu teorias da conspiração sobre urnas eletrônicas e promoveu ameaças golpistas.

Se for condenado, Bolsonaro não poderá se candidatar por oito anos a contar da data da eleição. Benedito é o primeiro a votar. Depois, apresentam seus votos os outros seis ministros da corte.

O ministro é o corregedor-geral da corte desde setembro do ano passado e, durante a eleição, tomou uma série de decisões que atingiram uma suposta rede de desinformação ligada a Bolsonaro e limitou ganhos políticos do ex-chefe do Executivo com o uso da máquina pública.

Em maio deste ano, também foi o principal responsável pela cassação do mandato de deputado de Deltan Dallagnol (Podemos-PR), ex-procurador da República que foi um dos algozes de Lula na Operação Lava Jato.

Benedito apresentou um voto com críticas severas a Deltan e afirmou que o ex-procurador deixou o cargo com o objetivo de driblar a inelegibilidade. Ele foi seguido por unanimidade pelos demais ministros.

Na ação contra Deltan, partidos que apoiaram Lula alegaram que o ex-procurador não poderia ter deixado a carreira para entrar na política porque respondia a sindicâncias, reclamações disciplinares e pedidos de providencias junto ao CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) –que fiscaliza os deveres funcionais dos integrantes do Ministério Público.

Benedito disse que Deltan “antecipou sua exoneração em fraude à lei”. “Ele se utilizou de subterfúgios para se esquivar de PADs ou outros casos envolvendo suposta improbidade administrativa e lesão aos cofres públicos. Tudo isso porque a gravidade dos fatos poderia levá-lo à demissão.”

No TSE, foi de responsabilidade de Benedito a decisão de proibir Bolsonaro de usar na sua propaganda eleitoral, em todos os meios, imagens feitas durante os eventos oficiais de 7 de Setembro. Ele estabeleceu multa diária de R$ 10 mil em caso de descumprimento e a exclusão de trechos da transmissão na TV Brasil.

Em outro caso, Benedito afirmou que a auditoria divulgada pelo PL, partido de Bolsonaro, com questionamentos às urnas fugia da fiscalização permitida do pleito, citava narrativas já derrotadas e tentava desacreditar o sistema eleitoral.

Ele acionou o MPE (Ministério Público Eleitoral) para avaliar se foram divulgadas informações sabidamente falsas para atingir o sistema eletrônico de votação. Ainda ressaltou no mesmo despacho que o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, também era responsável pelo documento.

Benedito chegou ao STJ em 2008 por indicação de Lula. O nome do corregedor foi escolhido em 2003 pelo ministro da Justiça à época, Márcio Thomaz Bastos (morto em 2014), inicialmente para uma vaga aberta no STF.
O atual corregedor do TSE era desembargador do TRF-2 (Tribunal Regional Federal da 2ª Região), do Rio de Janeiro. A intenção de Lula era indicar uma pessoa negra ao Supremo.

A sugestão de Thomaz Bastos foi preterida em benefício de Joaquim Barbosa, mas Benedito acabaria indicado ao STJ por Lula anos mais tarde. Em uma série de outras vezes voltou a figurar como candidato a uma vaga no Supremo.
Foi por causa de uma dessas ocasiões que ele acabou sendo citado por Léo Pinheiro, ex-presidente da empreiteira OAS, em sua delação premiada.

Ao negociar acordo de delação, Léo Pinheiro afirmou que conheceu o ministro em 2013 e que se reuniu com ele para discutir disputas judiciais envolvendo a construtora no STJ; e que até o início de 2014 Benedito julgou favoravelmente em duas causas o que a empresa pleiteava.

Disse que houve pedidos de Benedito por apoio a sua postulação a ministro do STF, que à época estava com cadeira vaga.

Em mensagens, de acordo com o ex-presidente da OAS, Benedito lhe pediu “empenho e dedicação” ao seu “projeto”; e em encontros solicitou que Léo Pinheiro falasse com políticos com quem tinha relação.

Antes mesmo da homologação da delação de Léo Pinheiro, em 2019, houve a abertura de um procedimento de investigação sobre o ministro, mas a então procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu arquivamento por extinção da punibilidade e prescrição, segundo a reportagem apurou.

O magistrado chegou a ter contra si um pedido de providências no CNJ (Conselho Nacional de Justiça) em 2015, que também acabou arquivado, no ano seguinte. O ministro não tem comentado a respeito desse tema.

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