‘Se alguém fez teatro, foi o presidente Bolsonaro’, diz Kajuru após conversa sobre CPI da Covid
Parlamentar também ironizou o fato de o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) ter afirmado que iria contra ele no Conselho de Ética
Renato Machado, do DF – Pivô da mais recente crise envolvendo o governo federal, o senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO) afirmou que não cometeu nenhum crime ao gravar e divulgar o conteúdo de um telefonema mantido com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
Kajuru também disse que sua ligação não foi nenhuma armadilha e que ele não estava fazendo nenhum “teatro” durante a conversa.
“Se alguém fez teatro foi o presidente Bolsonaro. Eu não fiz teatro nenhum, não. Eu fui reivindicar o meu direito de cobrar dele para ele ser justo e não colocar todo mundo [todos os senadores] na mesma vala”, afirmou ao jornal Folha de S.Paulo.
Durante a conversa telefônica, Bolsonaro sugere ao parlamentar entrar com pedido de impeachment de ministros do Supremo, além de pedir para ampliar o escopo da CPI para investigar prefeitos e governadores.
O presidente da República também ofende o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), autor do requerimento para instalar a CPI da Covid, e afirma que queria “sair na porrada” com ele.
Kajuru afirmou que o presidente teve chances de se opor à divulgação, mas que não o fez e apenas hoje “mudou de ideia”, muito provavelmente após ter sido alertado de que cometeu erros.
O parlamentar também ironizou o fato de o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) ter afirmado que iria contra ele no Conselho de Ética.
“A gente iria juntos, cada um com o seu motivo. Eu não cometi crime nenhum. Qual crime que eu cometi? E ele?”, questiona, em referência aos pedido de abertura de procedimento contra o filho do presidente, por conta das acusações de crime de “rachadinha”.
PERGUNTA – Como o senhor viu a reclamação hoje do presidente Jair Bolsonaro a respeito do vazamento da conversa entre vocês dois?
JORGE KAJURU – Eu vejo que ela só aconteceu hoje, porque alguém, como o Mourão, ou sei lá quem chegou nele e falou que ele não deveria ter agido como agiu na conversa comigo. Aí ele mudou de opinião. Porque, se ele estivesse realmente chateado, ele poderia ter ligado para mim ontem, ou então no nosso telefonema às 12h40, ter falado: ‘Não, Kajuru, não põe isso no ar, não’.
Eu liguei rapidinho, não gravei [a segunda conversa] porque falei muito rápido. Dei dois comunicados para ele: ‘Presidente, primeiro o [senador] Alessandro Vieira entrou com requerimento para estender a governadores e prefeitos a investigação, portanto o senhor não tem mais nada que falar nesse assunto. E segundo, aquela conversa nossa eu vou colocar no ar agora’. Então comuniquei e ele falou: ‘Não, não, tudo bem, tchau, tchau”.
Por que o senhor ligou inicialmente para o presidente?
JK – No sábado à noite, quando telefonei para ele, foi exclusivamente para reclamar dele. Basta você ouvir a gravação. Foi para reclamar dele que ele não foi correto com outros senadores e nem comigo, ao generalizar todos os senadores que queriam fazer só uma CPI contra ele, que ele chamou de “CPI Sacana”. E dizer que todos os senadores só querem fazer CPI contra ele.
Eu fui falar para ele, mas sempre reforçando isso: ‘O senhor vai dar uma declaração, que eu liguei para o senhor, que eu deixei claro para o senhor, porque o senhor colocou todo o mundo no mesmo balaio’. Chegou a chamar de canalhada todo mundo. Então o que fiz foi isso. Aí ontem [domingo] eu decidi colocar no ar porque é público, eu disse no Senado, na tribuna do Senado, que toda conversa minha com político eu gravo.
Então foi isso que eu fiz com ele. Considerei que era importante [divulgar], não vi crime nenhum, porque toda vez que conversei com ele, sobre diabetes, sobre outros assuntos, eu botei no ar a nossa conversa. E ele nunca reclamou. Por quê? Porque quando era bom não reclamava.
Tem mais algo a ser divulgado?
JK – Não, a única parte que nós cortamos foi ele chamando os senadores de canalhada e xingando o Randolfe [Rodrigues], chamou de bosta. Tudo, tudo, tudo [foi divulgado]. Até porque não tinha mais nada para cortar, eu não corto entrevista de ninguém. Não sou editor de telejornal, não. Quem corta entrevista é televisão, normalmente, ou rádio.
Qual foi a motivação do senhor?
JK – Ontem [domingo] de manhã, ouvindo ela de novo, eu falei assim: ‘Vou colocar no ar, porque é importante’. Porque eu pensei que isso aí esclarece de vez aos outros senadores que o Bolsonaro, pela primeira vez, disse que não é contra a CPI, porque eu fiz ele falar isso. Ele falou assim: ‘Não, Kajuru, se ouvir governadores e prefeitos, tem mais é que ter CPI mesmo, pronto, acabou, não estou nem aí. Coloca tudo pra frente, impeachment, CPI, mas tem que ouvir governadores e prefeitos’.
Então, para mim, era importante a gravação ser colocada. E, como ele sabe e todos os políticos sabem, eu gravo mesmo, até porque de repente amanhã o Bolsonaro não iria fazer o que prometeu e obviamente não fez, que era ser justo com os senadores favoráveis à investigação de governadores e prefeitos, e não chamar todo mundo de canalhada.
O filho do presidente, senador Flávio Bolsonaro, disse que vai levar o senhor ao Conselho de Ética.
JK – Eu pensei que seria bom ele também ir. A gente iria juntos, cada um com o seu motivo. Eu não cometi crime nenhum. Qual crime que eu cometi? E ele?
Há quem veja a conversa como um “teatro”, especialmente no STF.
JK – Eu não faço parte de teatro. Que esses ministros me respeitem. Eu respeito alguns só, tanto que estou pedindo impeachment de Alexandre de Moraes e no ano passado pedi do Gilmar Mendes. Então, esse tipo de gente que está falando em off, eu ofereço meu desprezo, total. Não tenho nada que comentar uma barbaridade dessa, dita dessa forma.
Que teatro? Ouve a gravação. Da minha parte? Se alguém fez teatro foi o presidente Bolsonaro. Eu não fiz teatro nenhum, não. Eu fui reivindicar o meu direito de cobrar dele para ele ser justo e não colocar todo mundo na mesma vala. Ouça a gravação. Que teatro que tem? Eu não participo de teatro nenhum, não. Quem faz teatro é o Supremo Tribunal Federal, basta ver os julgamentos, com esses placares de 6 a 5. Ali que é teatro. Me respeitem.
O presidente está usando politicamente o episódio para reagir à CPI?
JK – Claro que sim, evidente, porque, se você pegar a gravação e fizer uma análise política dela, ela foi positiva para ele. Onde que foi negativa? Ela foi positiva para ele. Agora ele me pediu para botar o resto e eu botei. Agora tem essa parte negativa, a maneira como ele tratou os senadores, em especial o Randolfe. Foi a primeira declaração em que ele realmente disse que quer a CPI, porque antes ele estava contra a CPI. Só tinha declaração dele xingando todo o mundo.
Foi a primeira vez que ele deixou clara a opinião dele, que é a favor do pedido de impeachment de ministro. Ainda perguntou para mim: ‘Você entrou com algum? Contra quem?’. Aí disse que entrei contra o Alexandre de Moraes. ‘Você entrou no Supremo?’. ‘Entrei no Supremo com o [Luís Roberto] Barroso. Fiz a minha obrigação’, falei para ele. Porque ele não sabia disso, o presidente não sabia. A imprensa noticiou. Ele não tomou conhecimento porque não quis ou então fingiu para mim que não sabia.
Acredita que o presidente pode ter cometido crime ao articular um impeachment de ministro do STF?
JK – Ele não me instigou. Eu entrei antes de ele falar comigo. Eu disse: ‘Já fiz isso, presidente’. Não foi ele que determinou, não. Eu entrei tem 60 dias.
Não, não, eu não considero isso crime. Eu considero que foi uma opinião dada a ele e ele se mostrou duvidoso: ‘Ah, o Kajuru não vai entrar com pedido de impeachment, nada’. E quis falar isso para mim. Imagino isso. Mas eu não posso crer que ele não sabia, já tinha notícia na imprensa, nós conseguimos já quase 3 milhões de assinaturas. Isso é de domínio público, que eu entrei. Pode ter tentado fazer isso, mas isso comigo não cola, não. Por isso que com todo político que eu converso eu gravo, para ficar claro ou esclarecer.
Se precisar responder judicialmente pelo vazamento, pretende também acionar Bolsonaro ou Flávio na Justiça?
JK – Evidente, meus advogados estão prontos e a postos. E eu ouvi, de um promotor respeitado de Goiás, que não cometi crime nenhum. Estou de cabeça erguida. Quem veio pedir o Conselho de Ética foi quem todo mundo quer abrir processo no Conselho de Ética. Foi por isso que eu ri.