Governança corporativa e os novos rumos para a Universidade Estadual de Goiás

Neste quinto artigo publicado pelo Portal 6, o professor doutor Severo defende que instituição precisa adotar uma boa governança corporativa para estabelecer um novo rumo para a administração futura

Professor Severo Professor Severo -
(Foto: Reprodução)

Reformas administrativas do Estado sempre se ajustam ao pensamento político e ideológico construído ao longo de uma campanha eleitoral. Neste sentido, é sob essa perspectiva de mudança organizacional que o Estado estabelece suas políticas de gestão pública sob o enfoque da eficiência administrativa.

O Governo eleito, seja ele de qualquer matiz política e ideológica, emplaca suas reformas estruturantes no Estado sempre com a visão de promover o desenvolvimento econômico e social da sociedade. Neste sentido, acredito que as intenções são sempre verdadeiras, considerando as crenças e os valores sociais daqueles que assumem a gestão do Estado. Sendo assim, todavia, sempre haverá uma controvérsia quanto a eficiência e eficácia em relação as reformas administrativas promovidas pelo Estado, pois a análise do seu sucesso ou insucesso está sempre sob a perspectiva da visão e do viés político-ideológico de cada observador da sociedade.

Entretanto, a ciência da administração tem um conjunto de ferramentas que quando aplicadas corretamente resultam na eficiência e eficácia da gestão pública. Neste contexto, o conceito de governança corporativa aplicado à gestão pública tornase uma ferramenta importante de avaliação das reformas administrativas realizadas pelo Estado, pois estabelece conjunto de normas direcionadas para regulamentar a relação entre Estado (representante eleito da sociedade) e os gestores (agentes públicos) dos órgãos da administração direta e indireta, no que concerne ao conjunto de seus papéis e ao seu desempenho na condução de políticas públicas. Todavia, é preciso estar atento ao que a ciência da administração denomina conflito de agência, quando o gestor ou agente dotado de interesses individuais pode não buscar os objetivos ditados pelo Estado.

Este fenômeno acontece quando o Estado, representado pelo Poder Executivo, não tem um controle efetivo em relação as ações e as demandas da técnico-burocracia. Por outro lado, pode haver também ações políticas advindas de outros públicos interessados (a sociedade) que se associam aos interesses dos agentes (gestores públicos) na defesa de determinados pleitos de um certo segmento econômico ou social. Por isso, as tomadas de decisões dos agentes públicos, onde há uma ou mais partes com interesses distintos, pode não comportar as melhores práticas gestão que atendam aos interesses da organização na consecução das suas atividades fins ou dos seus principais stakeholders (o Estado e a Sociedade).

A UEG é um caso emblemático de governança corporativa no que se refere ao conflito de interesses coletivo (sociedade) e as práticas de gestão corporativa transparente do administrador público (agente). O ex-reitor da UEG, Haroldo Reimer, submeteu a gestão acadêmica e administrativa aos interesses de determinado segmento político, mediante tomada de decisões de abertura de novos cursos de graduação em diversas áreas de conhecimento para atender os interesses de lideranças políticas regionais. Não houve estudo técnico de demanda local ou regional, bem como o de impacto orçamental de custeio administrativo e pessoal para aprovar os cursos, mas sim interesses distintos e políticos.

Decisões essas avalizadas pela leniência do Conselho Universitário da época. Portanto, neste caso, foram decisões tomadas pelo Reitor (agente público) em apoiar projetos de interesses individuais, sobrecarregando a infraestrutura física, logística e de recursos humanos e de recursos orçamentários para além da capacidade instalada da Universidade. Neste ponto, o interesse do agente (Reitor) sobrepõe ao interesse da sociedade (Estado) expresso em políticas e diretrizes de Governo que, para não haver o comprometimento da eficiência e eficácia da gestão da Universitária, a ampliação e ofertas de novos cursos deveriam estar fundamentados em estudos de viabilidade técnica, pedagógica e de custeio administrativo e de pessoal.

Ainda, neste contexto, tem-se, na reforma administrativa da Universidade Estadual de Goiás, outro exemplo de conflito de agência como o ponto de ruptura entre o Estado (Poder Executivo eleito e empossado 2019) e a Reitoria da Universidade (eleita para o quadriênio 2016-2020),que veio a renunciar ao mandato em 2019. Fato este que ocasionou a intervenção administrativa na Universidade. Neste sentido, observa-se a ação do poder executivo (Estado) representando a sociedade, impondo ao gestor público (agente) um conjunto normas e padrões legais em que determina os parâmetros legais da estrutura e funcionamento da organização pública, mediante suas perspectivas de modelo de gestão. Cabe, então, ao gestor público promover a implementação das normativas e empreender de forma desejável a gestão da organização.

Entretanto, o agente interventor (reitor interino), mediante o uso de Resoluções em Ad referendum, passa a legislar e tomar decisões acadêmicas e administrativa sem a participação da comunidade acadêmica via o Conselho Universitário. Portanto, embora as decisões estivessem alicerçadas pelo mantra da legalidade, legitimidade e impessoalidade, não houve transparência e respeito aos valores institucionais da academia. Neste sentido, cabe ressaltar o quanto as relações interorganizacionais e intraorgonizacionais são importantes para o processo da Governança Corporativa em órgão da administração direta e indireta. Pois há uma linha muito tênue que separa o interesse coletivo (sociedade) ao interesse individual e corporativo do agente público no desempenho de suas funções.

Embora a governança corporativa em organização pública se alicerça em fundamentos da ciência da administração empresarial, o modelo da administração pública de governança corporativa é abrangida por uma ampla e complexa cadeia de relações e interações sociais e políticas com o meio envolvente (sociedade), que por intermédio de seus stakeholder (políticos e sociedade civil organizada) procuram influenciar as organizações públicas pela ação política. Então, como solucionar este dilema? É simples. Deve-se organizar um Código de Ética Profissional baseado em princípios universais norteadores da boa governança corporativa, de modo a assegurar a equidade, transparência e valores éticos nas relações entre o principal (Estado) e o agente (gestor público) e os demais stakeholders (sociedade).

Neste sentido, a Universidade Estadual de Goiás necessita de práticas da boa governança corporativa para estabelecer um novo rumo para a administração futura. A Universidade, também, precisa legitimar sua liderança suprema via a eleição do Reitor para o quadriênio 2021-2024 para superar a adversidade passada e trilhar novos caminhos.

É preciso, também, construir um modelo de gestão baseado em princípios universais que regem uma governança corporativa transparente e de valores éticos, visando atingir sua missão institucional. Neste ponto, o Conselho Superior Universitário tem muito a contribuir para a construção de um modelo de governança corporativa para UEG.

Cabe, também, ao novo Conselho Universitário, eleito pela comunidade acadêmica, fazer uma moção para cobrar a realização de eleição para Reitor em novembro deste ano, conforme determina o Estatuto da Universidade, aprovado no bojo da Lei nº 20.748, de 17 de janeiro de 2020. É preciso encerrar a época das gestões interinas. Já se passaram 21 meses com a nau à deriva. A UEG tem que buscar novos rumos. Concluo parafraseando o filósofo Sêneca: quando se navega sem destino, nenhum vento é favorável.

Francisco Alberto Severo de Almeida é professor da UEG, doutor em Administração pela FEA/USP e pós-doutor em Gestão da Informação pela Universidade do Porto- Portugal. Membro eleito do Conselho Universitário da UEG

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