Lula defende usar Banco do Brics para contornar dólar no comércio
"Por que não podemos fazer o nosso comércio lastreado na nossa moeda?", perguntou ele durante cerimônia
NELSON DE SÁ
XANGAI, CHINA (FOLHAPRESS) – O presidente Lula defendeu, na cerimônia de posse de Dilma Rousseff no Banco do Brics (Novo Banco de Desenvolvimento, NDB na sigla em inglês), a ampliação do comércio nas próprias moedas pelos integrantes da instituição e até mesmo uma moeda do grupo Brics.
“Por que não podemos fazer o nosso comércio lastreado na nossa moeda?”, perguntou ele, sob aplausos, ao deixar o discurso escrito e improvisar. “Quem é que decidiu que era o dólar? Nós precisamos ter uma moeda que transforme os países numa situação um pouco mais tranquila, porque hoje um país precisa correr atrás de dólar para exportar.”
Admitiu que “é difícil, porque tem gente mal acostumada”, mas também é necessário não apressar a mudança, voltando-se para Dilma e sugerindo que ela aprenda com a “paciência” da China.
“Por que o Brics não pode ter uma moeda que possa financiar a relação comercial entre Brasil e China, entre o Brasil e os outros países?”, perguntou. “Eu acho que o século 21 pode nos ajudar, quem sabe, a fazer as coisas [de maneira] diferente.”
Defendeu o NDB como uma alternativa ao FMI (Fundo Monetário Internacional), para que os investimentos internacionais não resultem na transferência de comando da política econômica dos países em desenvolvimento.
Sustentou o direito dos países a se endividarem, para investir, sem a pressão que enfrentam hoje em caso de dificuldade. “Não cabe ficar asfixiando as economias como estão fazendo agora com a Argentina, o FMI”, afirmou.
“Nenhum governante pode trabalhar com uma faca na garganta porque está devendo. Os bancos têm que ter paciência e, se for preciso, renovar os acordos. O FMI ou qualquer outro banco, quando empresta para um país do Terceiro Mundo, as pessoas se sentem no direito de mandar, de administrar a conta do país. Como se os países virassem reféns daquele que emprestou dinheiro.”
Voltou a criticar os obstáculos à ampliação do poder das economias emergentes no FMI e no Banco Mundial e a defender a expansão do número de integrantes do NDB, afirmando que Dilma dará impulso à mudança. “Que empreste dinheiro na perspectiva de ajudar os países e não de asfixiar os países em desenvolvimento”, disse.
“O Banco do Brics representa muito para quem sonha com um novo mundo, para quem tem consciência da necessidade de desenvolvimento e que, portanto, precisa de dinheiro para fazer os investimentos”, acrescentou Lula.
Em seu discurso, antes do presidente brasileiro, a nova presidente da instituição defendeu o NDB como um “banco do Sul Global”, voltado não só para os países-membros, mas para todos aqueles em desenvolvimento. Também enfatizou, para tanto, a expansão.
E adiantou que pretende ampliar o recurso às moedas dos próprios integrantes também para os investimentos a serem aprovados. “Buscaremos financiar nossos projetos em moedas locais, privilegiando os mercados domésticos”, disse Dilma, acrescentando que vai buscar “construir alternativas financeiras robustas”.
No dia anterior, quarta, o banco indicado pela China para fazer a compensação em renminbi no mercado brasileiro, o ICBC, anunciou ter feito a primeira transação na moeda chinesa.
No negócio, não detalhado, o ICBC apoiou as duas partidas, exportador e importador, a fechar a transação diretamente na moeda chinesa. “Isso demonstrou vantagens significativas em termos de eficiência de compensação, custos de taxa de câmbio e a segurança dos fluxos de fundos e informação”, afirmou o banco, segundo a agência de notícias chinesa Xinhua.